segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O ANÃO DO AÇOUGUE - PARTE VII


O FODA NÃO É A SUBIDA. É A QUEDA.

O anão enfim, foi anunciado. Bombom ficou onde estava. Já não se importava mais em se tornar alvo do anão. De receber sua gala. O tiro daquela vez foi certeiro em seu peito e ela foi jogada para trás com o impacto. O povaréu foi abaixo. Bombom ao chão, toda aberta, lambia agora com prazer o sêmen dourado do anão que lhe banhara todo o corpo. Lambuzara-se toda. O líquido escorria até a ponta do tablado caindo lentamente no piso de madeira. Disse brincando para um dos bebuns que bebia ao meu lado, que o sêmen do anão era sagrado. Uma espécie de chá alucinógeno mais potente que o Ayuasca. Foi o que eu disse. Ele correu para aparar com o copo. A notícia se espalhou. Logo todos queriam um pouco. Espremiam-se para receber goela abaixo o sêmen do anão. Eles acreditavam nisso. Alguns chegaram a afirmar que viam luzes douradas. Que se sentiam enormemente purificados. Naquele momento percebi o quanto é fácil enganar as pessoas. É por isso que as Igrejas existem. Ganhei alguns trocados extras comercializando o sêmen do anão no mercado negro. O Delirium nunca mais foi o mesmo. Todos os dias o lugar recebia um contingente imenso de punheteiros vindo de todos os pontos da cidade. Seu Tapajós passou a cobrar a entrada. E com isso, obviamente, foi entrando mais e mais dinheiro na casa. Tornei-me seu sócio. Sugeri que ampliássemos o lugar para comportar a multidão que jorrava casa à dentro. Seu Tapajós alugou o prédio ao lado. O lugar aumentou de tamanho. Uma a uma, as meninas voltavam: Mel Trepadeira, Joyce Bananinha, Bruninha Boquete, Fernandona Moedora de pica... Foram chegando mais e mais garotas querendo trabalhar na casa. Lembro-me de Mel. Era incrível. Escalava o ferro com sua buceta. Ia bem alto no céu e voltava. Daí a razão do apelido: Mel Trepadeira. Mel reclamava que a altura do ferro era pequena demais. Uma afronta. Podia ir mais longe. Sugeriu que aumentássemos o forro da casa. E foi o que fizemos. Àquela altura tínhamos bastante dinheiro no caixa. Mandávamos ver. Mandei construir um pequeno apartamento para mim e para o anão e passamos a morar naquele bordel. Na parte mais alta daquele prédio. Todas as manhãs, com uma doce ressaca, eu abria os janelões portugueses e via toda aquela parte da cidade: a Igreja Matriz, o porto Hidroviário, a cúpula do Teatro Amazonas, o Holland American Line ancorado, com toda sua pungência... Manaus nunca me foi tão bela. Tão fresca. Tão doce. Me senti o rei. Insolente. Esbanjador. Tinha dinheiro. Todas as mulheres que eu queria. Mulheres sujas. Mulheres limpas. Todos os buracos. Metia em todos os buracos. Metia. Metia. Metia. Metia mesmo pra valer, como se cada buraco daquele fosse o último da face da terra. Metia com fúria. Era como o anão ejaculando. Desisti de escrever. Não me interessava mais escrever. Queria só foder. Beber. Curtir! Para quê perder tempo escrevendo? Tentando ganhar a vida como escritor se eu tinha o mundo pela frente? Eu tinha agora uma janela nos altos de um sobrado na viela Mauá que se abria todos as manhãs para eu vislumbrar as estações daqueles anos loucos. Mas não pensem que esqueci do anão. Quando regressei de minha primeira e única viagem de férias da Ásia, trouxe-lhe do Japão um quimono dourado. Feito sob medida para ele. Estreou o quimono numa noite literalmente de gala. Ficou perfeito e alinhado no quimono que lhe dei. As putas o sediavam naquele quimono, mas ele sempre broxava. Cogitei que o problema tivesse na cabeça do anão. Algum trauma de infância, sei lá. Paguei-lhe uma profissional da área para cuidar da sua cabeça. A melhor da cidade. Mas não adiantou muito, não. O anão continuou broxando.
“Seu Mário – disse-me a psicóloga em seu consultório – o homem que broxa é o homem que se torna homem de verdade.” Não esqueço nunca mais aquelas palavras terríveis. Parei de me preocupar com isso. Da Cruz ejaculando e proporcionando felicidade a todos, era o que importava. Ele agora, metido em seu quimono dourado, ejaculava do tablado sobre a multidão. Todos se banhavam com o esperma do anão. Viam luzes. Visões. Lambiam-se como animaiszinhos. Alguns caíam de cara na poça dourada que se formava no chão de madeira. Prometi a Da Cruz, levá-lo para conhecer Catar no ano seguinte. Mas ficou só na promessa. O anão nem sonhando podia arrastar seus pészinhos dali. Ordem do seu Tapajós. E o tempo foi passando...
***
Um dia, Jesus foi ter comigo. Estava bastante abatido. Bebendo demais. Havia perdido definitivamente Cristal para um fiscal da receita que era comum e que freqüentava o Delirium. Queria minha ajuda:

“Fale com ela, seu Mário. Ela está cega. Tudo isso aqui vai passar.” Ouvia o insolente enrolado em meu robe indiano. Fumava meu cachimbo sossegado, olhando da varanda, a rua lá embaixo. Me sentia um autentico Al Capone decidindo o destino das pessoas. Todos vinham pedir conselhos. E aquele foi o mais idiota que ouvi:

“Olha, homem, Cristal não lhe ama. Por que não a deixa em paz e pare de sofrer como um idiota.” Disse pra ele. Jesus olhou-me daquele jeito e disse:


“Preste bem atenção, seu Mário: o problema não é a subida, é a queda.” E se foi mancando e balançando os terços. Fiquei com aquilo formigando na cabeça. Jesus era um idiota. Derrotado. Nunca foi com a minha cara mesmo. Depois daquela audiência, o sujeito relaxou de aparência completamente. Deixou a barba e o cabelo crescer. Andava sujo, em andrajos, pelos arredores da Matriz, parecendo um messias esquizofrênico. Pregava o dia inteiro na porta do Delirium, dizendo: “O anão é uma mentira! O anão é uma mentira! Mas ninguém lhe dava ouvidos. Havia aquele sorriso congelado em seu rosto. Quem levaria o cara a sério? O fato é que Jesus iniciou uma verdadeira cruzada contra o Delirium Drinks. Reunira em torno dele uns poucos séquitos que haviam se desmembrado da Igreja Universal, e numa tarde – como o exército de brancalione – a corja de fanáticos subiu enfurecida as escadas do bordel. Houve uma confusão danada. Jesus gritava gesticulava da porta: “O anão é uma mentira! O anão é uma mentira! Voltem às suas vidas!” Um dos bêbados tomando aquilo como um despropósito, arremessou Jesus escada abaixo. O infeliz torceu o pescoço e morreu. Fui olhar o corpo lá embaixo. Mesmo morto, ele ainda sorria. Não veio a polícia. Não veio o jornal. O investigador responsável pela investigação do crime, era frequentador da casa, e que portanto, não deu importância ao caso. Nem a própria Cristal que no mês seguinte, casara com o cara da Receita que era comum. Jesus era mais um esquizofrênico. E tudo voltou ao normal no Delirium. Sem mais aborrecimentos...

Nenhum comentário:

Postar um comentário