quinta-feira, 28 de novembro de 2013

O LAMBEDOR DE BUCETAS

PARTE VI

JEAN E SIMONE

Creio que Simone àquela altura de seu relacionamento com Jean já estivesse bastante enfastiada com as incansáveis linguadas dele em sua buceta sempre quando soava o seu sedutor apelo  para que ela vestisse a conserlete vermelha a combinar  com os espartilhos da mesma cor e assim prostrar-se de saltos altos na pia da cozinha no árduo e doce exercício de cortar as cebolas naquele pequeno, porém, elegante apartamento de apenas um cômodo  na Quartier Latin, onde Jean vivia sozinho. Penso assim, porque Simone naquela tarde especial de maio agora observava Jean enrolado em seu robe cor de vinho, fumando tranquilamente o seu cachimbo da sacada daquele apartamento acolchegante, tão compenetrado que ele estava ao apreciar a multidão de jovens lá embaixo ganhando as ruas e avenidas da Champs ElIsées lutando pela liberdade dos valores e pelo fim da opressão politica na Argélia.  Eram tempos conturbados e de mudanças aqueles...
É evidente que Simone tinha projetos novos na cabeça e reorganizava seus pensamentos feministas acerca de toda aquela sua relação com Jean, enquanto ouviam Sargent Peppers(é bom que se diga) junto ao balbúrdio das ruas, de maneira que nesta mesma tarde ela decidiu mudar de conduta sexual, propondo a ele que os papéis fossem invertidos:

Como assim, querida?
Que talvez eu devesse experimentar um pouco dessa sensação prazerosa que tu sentes ao penetrar rasteiramente a tua lingua em minha buceta.

Foi o que ela exatamente disse nesta tarde acinzentada de maio reforçando as chamas de sua piteira.  E prosseguiu:

Que devessemos compartilhar os mesmos sentimentos, acaso não é isso que pregamos sempre? A liberdade dos prazeres e os direitos iguais?

Jean deixou a sacada um instante e aproximou-se dela com seu cachimbo de aroma indiscutível para inspecionar melhor aquela sua proposta estranhamente indecorosa:

Está dizendo que estás enfastiada com as minhas linguadas?

Estou dizendo que me sinto no direito também de compartilhar do mesmo prazer.

O homenzinho enrolado em seu robe, fumando ainda elegantemente o seu cachimbo, pensou um pouco antes de dizer:

É justo...mas não sei se conseguiria levar uma linguada no cu, querida, se é isto exatamente o que está propondo.

BINGO!

Simone, é claro, para melhor tranquilizar o seu parceiro sorriu docemente, acariciando o pescoço dele que era gordo e pequeno. Uma leve fumaça aromante que vinha do cachimbo de Jean e da piteira de Simone, logo acoplaram-se copulando como dois espectros amantes a fundir-se em uma só fumaça espessa, cujo gozo resultou em uma espiral de luminosidade de tons coloridos e ofuscantes...E Jean sorriu desconsertado como a um menino que leva caçuletas dos mais grandes ao ouví-la dizer:

Uma linguada no cu, querido, não vai demover de sua órbita machista o seu prestígio de filósofo junto aquelas jovenzinhas existencialistas de cabecinhas vazias...

O que você na verdade quer me dizer, Simone? Não foi este Bourbon praguense que lhe deixou com estes pensamentos desvairados, foi?

Você me conhece a vinte anos, Jean. Chega de interpretações aos olhos dos outros.

Tens razão, contudo, se eu permitir, você não vai registrar tudo isto em seu novo livro, pois não?

Prometo. Será este o nosso segredinho...

E assim sucedeu que Jean permitisse à Simone que ela colocasse em voga o seu projeto.
                                                                  MALDITOS POMBOS!

Devo aclararvos, portanto, que o nosso homenzinho era pouco desfavorecido pelos paramentos da beleza que valem a um indivíduo de nosso gênero, vulgarmente o título de "belo homem", pois que Jean era um sujeito baixo, meio gordo, olhos míopes e redondamente claros os quais refugiavam-se cinicamente por trás de suas lentes grossas que usava, entretanto, o que o desfavorecia desse lado de feiura, a natureza compensava-lhe do outro, sendo Jean dotado de um intelecto espantoso e de ideias brilhantemente revolucionárias capaz de mudar o curso das vidas que o cercavam, mergulhando-as na fumaça de seu laborioso cachimbo de ideias. Simone, por sua vez, era de uma beleza fina e delicada como o próprio nome preconizava. Uma mulher de extrema elegância ao cruzar das pernas torneadas (devo dizer-lhes) olhos bonitos e penetrantes como bisturis cirúrgicos - menos adornos do que pretensão - eu diria -  mas de um caráter exigente e imperioso. Somado a isso, ainda havia também o brilhantismo intelectual e ousado, aliado ao fervor das ideias feministas  que viriam mais tarde protagonizar a liberdade sexual das mulheres. Era muito comum ver o casal desfilando suas ideias pelos Cafés badalados e elegantes da St.Honoré, ou da própria Champs Elisées, sempre cercados de existencialistas ou de jovenzinhas feministas de plantão que ouviam envaidecidamente o casal discorrer sobre a dissemetria sexual, Leibniz e política - e sobretudo, a crença sobre a condição absoluta do amor fincado nos alicerces da liberdade sexual... E as fumaças cobriam todo o Café ao som do trompete alegre  de Joe Williams que se vocês apurarem bem os seus ouvidos, o ouvirão tocar bem lá no fundo de suas almas embriagadas de paixão...

                                               
                                                    desenho: Jean Lumet


terça-feira, 26 de novembro de 2013

O LAMBEDOR DE BUCETAS

PARTE V

Nesses longos e torturantes dias chuvosos em que fiquei ali de prontidão na varanda de minha casa na incansável espera idolátrica por Josephine mantive-me fiel ao Marquês que me domesticava e encorajava-me o espirito com suas fustigadas que misturavam-se com os relâmpagos e açoites surdos da chuva no telhado de zinco da minha casa, devolvendo-me, assim - o velho e bom Marquês - o bom senso e a esperança que eu havia perdido da humanidade. Vivia ali então inocentemente todas as prefigurações do amor-paixão, ausência-presença, sofrimento-morte, evidenciando pois, um comportamento que merecia total desprezo por conta do Marquês  que me instruía ao relembrar que só a presença do objeto do desejo é o que conta. Presença e presente. Movimento e gozo. Pois que o objeto do desejo é o ser, e que o platonismo á moda de Goethe, a compaixão, a fraternidade, a caridade e demais sentimentos equívocos da razão, são sentimentos reservados aos que preferem se escravizar ao invés de deixar fluir o curso livre de suas paixões. Em síntese, o Marquês quis dizer-me sabiamente que as virtudes são sentimentos reservados aos fracos de espírito. E eu havia que concordar com ele e que portanto me era obrigado a acatar aquelas suas sábias e ríspidas palavras, até porque considerando-me um lambedor de bucetas, sabia por excelência o que ele reafirmava-me acerca da liberdade. E seguimos, pois, em meio ao temporal debatendo aquele ponto tão crucial á nossa existência.
                                                                       ***

A medida em que a chuva aumentava sua doce cólera, eu me diluía gradativamente invólucro na minha solidão miserável e desumana, a qual partilhava com o Marquês e com o meu cão Príapo que prostrava-se quieto ao ouvir atentamente os conselhos do velho libertino. Sim, todo homem tem um cão para preencher os ossos do vazio. Eu tinha o meu, chamado Príapo. Tudo que resta de um casamento catastrófico, senhores, é um cachorro. Príapo, portanto, partilhava desta minha mutilação secreta e desta minha nova expectativa acerca daquela espera. E a esta altura, se ia mais uma garrafa de Sauvignon e mais uma punheta frustrante. Mas neste meio termo, gostaria de falar sobre a função da língua ao deslizar sobre a buceta e dizer-lhe do fundo do meu coração palpitoso e flamejante que, ao contrário do que se pensa, a língua não domestica. Não se iluda. Por mais que o cavalheiro deste outro lado da tela suponha ser um exímio lambedor de bucetas, e isto a mim não caberá duvidar - não julgue que com isso você a aprisionará para sempre. Considere isso uma tolice bestial e ingênua, própria do gênero masculino que muitas vezes me envergonha e a qual reprovo a fundo. A língua não domestica, volto a dizer. Ou melhor, não aprisiona. (Infeliz da mulher que se entrega a esse sentimento prisional.) Ao contrário, ela liberta. Provocará neste pequeno pomarzinho do amor, outras variações e buscas por prazeres adversos. A buceta nasceu para ser livre como um passarinho, e em função disso, fazer suas escolhas e experimentações que a priori poderá nos soar estranhos e doentios, mas que são perfeitamente naturais. Faz parte do prazer, e todo o prazer, como há pouco me afirmava o Marquês, é uma eterna e incansável busca pela consolidação do espírito e da carne. Por mais que seja obsequioso e primoroso o efeito de uma lambida, a buceta sempre rejeitará todo tipo de relação que implique a ela total dependência entre indivíduos - mas não por desprezo absoluto ao amor, marca da carência e da subserviência humana, quero deixar claro, mas porque toda buceta nasceu para ser livre. Foi a esse ponto da verdade a que chegamos, eu e o Marquês. E com base nisso, e também aproveitando o breve ensejo vou lhes narrar a história de Jean e Simone, que tudo tem a ver com este parêntese acidental a que forçosamente fui obrigado a abrir...

                                                        desenhos: Namio Harukaua

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O PRAZER VEM COMO LADRÃO

PARTE IV

Sim, ela havia deixado bem claro isto e que portanto me mantive ereto a sua espera como um cachorro que aguarda o retorno de seu dono e por conta disso, quase congelei uma noite dessas na varanda de minha casa na esperança vã de vê-la chegando, dobrando a esquina da minha rua úmida de desejo...
"Você congelou mesmo na varanda, à minha espera, Mário Augusto? Tudo isto não é um exagero seu?"
"Não, meu doce. Fiquei a tua espera até tudo secar... até ver a última gota de ovalho cair do telhado... congelei na varanda de casa a tua espera, sim..."
Ela m-o-v-e-u d-e-l-i-c-a-d-a-m-e-n-t-e o-s c-í-l-i-o-s a-b-r-i-n-d-o e-m s-e-g-u-i-d-a u-m l-e-v-e e- e-t-e-r-n-o s-o-r-r-i-s-o n-a-q-u-e-l-e-s l-á-b-i-o-s d-e f-l-o-r que se eu não fui capaz de descrever esta imagem aos senhores com a perfeição que sempre almejei que eu então seja amaldiçoado para o resto de minha vida... Que estas minhas mãos se encham de lepra onde não possa mais segurar com destreza a pena que me toma a alma em descontrole e que me coloca em rota de colisão com a morte todas as vezes que aqui eu sento para lutar com as palavras e descrever tua beleza que é uma labareda ardendo dentro de mim...
"E o que você ouvia na ocasião, meu querido Não vais me dizer que era Claire de Lune do Bethoven que é docemente sofrível..."
"De acordo, mas na ocasião ouvia apenas as batidas doídas do meu coração, intercaladas com o som ensurdecedor dos grilos copulando..Grilos copulam depois da chuva. Mais vinho?"
"Por favor..."
O som que os senhores ouvirão agora são dos lábios de Josephine sorvendo delicadamente o vinho e se os senhores pudessem ao menos sentir a ínfima fração de  alegria de um homem no declínio de sua idade na presença de uma mulher de tamanha beleza extraordinária que sou até capaz de sair atropelando as palavras como agora em que tudo me foge ao controle que nem mesmo sei se saberia dizer o que sinto e que nada sou neste momento de glória embriagada de desejos sobrehumanos mas é necessário, por exemplo, falar de suas pernas firmes e maravilhosas outra vez entrefechadas e a minha língua por ali ser penteando marotamente como quem não quer nada até chegar ao seu sexo e ao cheiro do seu sexo lisinho e perfumado úmido e secreto, convenhamos, e da política interna do crotón encrespadinho que se esconde bem lá no fundo, a petalazinha do amor, e me delicio com a minha punheta depravada que soco agora com uma das mãos enquanto a outra dedilha sobre estas teclas e é nessas horas, eu confesso, que o instinto subjulga a razão e este nobre escriba deixa de lado o seu cavalheirismo e toda sua polidez e gentileza das palavras e me torno um canalha, contudo, convido a senhorita em especial (pois não pense que não sei que você me lê agora, espertinha, e como explicar este sorriso lindo brotando devagar no cantinho de seus lábios de Penelópe, hein?) e portanto não há motivo para envergonhar-se  e juntos proponho tocarmos aquela punhetinha cada um a sua maneira ou então imagine mesmo minha língua deslizando suavemente sobre sua rosa rubra de boquinha aberta feito passarinho mmmmm...que teu gosto sagrado de fêmea e o teu cheiro e tudo mais se entranha e permanece em mim eternamente e sou até capaz de sentir o momento exato que o teu gozo desagua no meu e fundirmos os nossos desejos num só corpo, numa só pele, num só átomo... e acho mesmo que definitivamente me perdi no emaranhado da tua púbis mas deixo aqui  selado  um pacto sem conjecturas e renovo meu convite a retornares a esta página sempre que sentir o fogo das palavras lhe consumindo por inteira, não se envergonhe minha pequena, sempre lhe terei com enorme desejo e carinho e aqui encerro este epítome ou seja lá o que raios for......


Sim, ela havia deixado bem claro isto e que portanto me mantive ereto a sua espera como um cachorro que aguarda o retorno de seu dono e por conta disso, quase congelei uma noite dessas na varanda de minha casa na esperança vã de vê-la chegando, dobrando a esquina da minha rua úmida de desejo...
_ Você congelou mesmo na varanda, à minha espera, Mário Augusto? Tudo isto não é um exagero seu?
_Não, meu doce. Fiquei a tua espera até tudo secar... até ver a última gota de ovalho cair do telhado... congelei na varanda de casa a tua espera...
Ela m-o-v-e-u d-e-l-i-c-a-d-a-m-e-n-t-e o-s c-í-l-i-o-s a-b-r-i-n-d-o e-m s-e-g-u-i-d-a u-m l-e-v-e e- e-t-e-r-n-o s-o-r-r-i-s-o n-a-q-u-e-l-e-s l-á-b-i-o-s d-e f-l-o-r que se eu não fui capaz de descrever esta imagem aos senhores com a perfeição que sempre almejei que eu então seja amaldiçoado para o resto de minha vida... que estas minhas mãos se encham de lepra onde não possa mais segurar com destreza a pena que me toma a alma em descontrole e que me coloca em rota de colisão com a morte todas as vezes que aqui eu sento para lutar com as palavras e descrever tua beleza que é uma labareda ardendo dentro de mim...
_E o que você ouvia na ocasião, meu querido? 
_As batidas doídas do meu coração, intercaladas com o som ensurdecedor dos grilos copulando..Grilos copulam depois da chuva. Mais vinho?
_Por favor...
(O som que os senhores ouvirão agora são dos lábios de Josephine sorvendo delicadamente o vinho e se os senhores pudessem ao menos sentir a ínfima fração de  alegria de um homem no declínio de sua idade na presença de uma mulher de tamanha beleza extraordinária que sou até capaz de sair atropelando as palavras como agora em que tudo me foge ao controle que nem mesmo sei se saberia dizer o que sinto e que nada sou neste momento de glória embriagada de desejos sobrehumanos mas é necessário pór exemplo falar de suas pernas firmes e maravilhosas outra vez entrefechadas e a minha língua por ali serpenteando marotamente como quem não quer nada até chegar ao seu sexo e ao cheiro do seu sexo lisinho e perfumado úmido e secreto, convenhamos, e da política interna do crotón encrespadinho que se esconde bem lá no fundo, a petalazinha do amor, e me delicio com a minha punheta depravada que soco agora com uma das mãos enquanto a outra dedilha nestas teclas e é nessas horas, eu confesso, que o instinto subjulga a razão e este nobre escriba deixa de lado o seu cavalheirismo e toda sua polidez e gentileza das palavras e me torno um canalha, contudo, convido a senhorita em especial (pois não pense que não sei que você me lê agora, espertinha, e como explicar este sorriso lindo brotando devagar no cantinho de seus lábios de Penelópe, hein?) e portanto não há motivo para envergonhar-se  e juntos proponho tocarmos aquela punhetinha cada um a sua maneira ou então imagine mesmo minha lingua deslizando suavemente sobre sua rosa rubra de boquinha aberta feito passarinho mmmmm...que teu gosto sagrado de fêmea e o teu cheiro e tudo mais se entranha e permanece em mim eternamente e sou até capaz de sentir o momento exato que o teu gozo desagua no meu e fundirmos os nossos desejos num só corpo, numa só pele, num só átomo... e acho mesmo que definitivamente me perdi no emaranhado da tua púbis mas deixo aqui  selado  um pacto sem conjecturas e renovo meu convite a retornares a esta página sempre que sentir o fogo das palavras lhe consumindo por inteira, não se envergonhe minha pequena, sempre lhe terei com enorme desejo e carinho e aqui encerro este epítome ou seja lá o que raios for......

O LAMBEDOR DE BUCETAS

III

CORRESPONDÊNCIAS

E tudo inicia-se com as minhas breves correspondências que mantive com Josephine:

"Prezada Josephine, escrevo-lhe estas breves e  tortuosas linhas para dizer-lhe que iniciei os primeiros rascunhos de O LAMBEDOR DE BUCETAS, e penso que já estou bem adiantado. Não quero antecipar os capítulos, mas já lhe adianto que terminarei ainda este mês. Este novo trabalho fará parte do livro de contos chamado A GARÇONETE SEM CALCINHA, onde empreendo uma viagem ao universo erótico. Sei que vais gostar...
Quanto ao "Marido Complacente", do Marquês de Sade, só vou lhe emprestar se vieres buscá-lo aqui em casa, pessoalmente. Já até separei aquele bom vinho para a ocasião. Pois que venha!

Seu eterno admirador,

Mário Augusto


"Querido Mário Augusto, muito feliz com a tua carta que recebi por estes dias. Continuas irressistível e encantador, e o aroma de tuas palavras ainda me embriagam a alma e deixam meu sexo em desalinho. Ainda escreves sem pudor como um pequeno e doce demoniozinho. É claro que diante deste teu sincero apelo, aliado á necessidade deste meu encontro com o Marquês, não me resta outra alternativa senão ir á tua casa fazer-lhe uma breve visita qualquer dia desses.
Em se tratando do vinho, espero ter reservado para esta ocasião, um bom e legítimo Port Noir, que ainda é o meu vinho preferido.
Um beijo de sua também admiradora que lhe tem com extremo louvor e dedicação."

Josephine



"Ah, minha doce amada Josephine, acabei por tornar-me escravo dos dias e das horas que se seguem e que me inundam infindavelmente o espirito naufragante de desejos, movido que fui pela promessa de sua possível vinda a esta minha humilde residência. Já antevejo-me, porém,  entregue ao gozo e aos desvarios deste encontro, de maneira que sigo embalado por pensamentos febris e docemente pecaminosos que só alimentam mais e mais o desejo frêmulo da fome insaciável de minha glande em chamas, entregue a que fiquei a mais agradável e profunda das lassidões...
Vem depressa, minha amada, que serei para ti, a tua agonia e a dissolução do teu gozo eterno o qual transbordará na suave lingua da verdade..."

(na língua está a verdade)
 Eternamente seu,

Mário Augusto

em resposta a esta minha última carta, ela então corajosamente escreveu-me estes versos ousados:

"trata-se de alcançar com sua língua, as amígdalas de minha buceta..."

...meu doce e obsceno amante,
tuas palavras são como caramelos recheados de sêmen
 a derreterem no céu de minha boca
 
        fecho meus olhos
              abro minhas pernas
         
        minha buceta
          de lábios bem abertos
                semininfa, semiputa...semitua
                                  vadia santa
             Nossa Senhora dos amores encaracolados
               mas se quiseres
                 entregarei-a depiladinha
                     ao santo altar
                     dos  vossos beijos e afagos...

Trata-se de alcançar com sua língua
as amígdalas de minha buceta...
                   
          (na língua está a verdade)

                                         Josephine

Diante destas palavras, eu então calei-me e resolvi esperar...

E

O LAMBEDOR DE BUCETAS

PARTE I

JOSEPHINE

 Talvez lhes devesse falar de Josephine, afinal.Pois bem. Ela de fato apareceu em minha casa para  minha grata e deleituosa surpresa. E estava divinamente maravilhosa trajando um vestidinho preto e curto colado ao corpo com desespero e sensualidade. Eram seis daquele dia e chovia maliciosamente uma chuva amiudada e doce vestida de lingerie... e Josephine estava ali, atrás da porta, e lhes asseguro que esta mulher é de extraordinária beleza que não sei bem definir...Enfim, ela me disse:
"Vais ficar aí parado só olhando, Mário Augusto? Não vai me convidar para entrar?"
Torno a repetir, ela estava divinamente sensual naquele vestidinho preto e curto colado ao corpo com desespero e sensualidade que meu pau despertou de seu sono de três longos dias de abstenção... Francamente não sei se Josephine estava ali por causa de mim ou pelo Marido Complacente do Marquês, o qual eu havia fielmente prometido a ela. Ah, bolas, mas isso não importa, eu não poderia deixar escapar aquela oportunidade ímpar de fazê-la entrar e de tê-la só para mim em minha alcova pecadora, após dias intermnáveis de espera...
"Ah, me desculpa, pode entrar! É que ainda estou extasiado com sua aparição..."
"Deixa de bobagens! Achou que eu não viria?"
"Para ser franco, sim. Mas isso é o que eu chamo de profunda devoção ao Marquês..."
Ela foi entrando devagar e o seu perfume inebriante de fêmea foi se espalhando e tomando conta da casa toda...

II

Ah, Cristo,  eu já ia até me esquecendo dos saltos que ela usava e que a deixava em privilegiada altura infinitamente superior a minha. Eles desfilaram vagarosamente ao longo da sala dedilhando com as suas pontas venenosas e afiadíssimas o assoalho da casa como alguém que dedilha um Bolero de Ravel... A divinal e encantadora criatura então sentou-se ao sofá e cruzou suas longas e tentadoras pernas que eram de formas modeladas e a que esse espetacular atrativo aos olhos juntava-se ainda a vivacidade simulada do espírito e um amor ainda vivo e latente pelos prazeres proibitivos da carne - tudo isso a mergulhar-me em profundo estorpor e extase, e que portanto, já tonteamente inflamado, e por não achar uma expressão  convenientemente cabível e menos primitiva para expressar aquele momento de rara contemplação a que é dado aos animais da mais vil e baixa casta, escapou-me furtiva e animalescamente esta frase pobre e infeliz, mas tão natural quanto a existência de um cachorro:
"Você como sempre linda, Josephine!"
"Você e seus elogios baratos, Mário Augusto! Onde está o Marquês?"
"Esta aqui, é claro,  pelo Marquês que lhe prometi, eu já ia esquecendo..."
"E também pelo Port Noir, lembras?
Putz, como dizer a ela que a grana não deu para comprar o Port Noir, por se tratar de um vinho caríssimo, mas a vida nos imprime ao espírito, a cautela e a perspicácia de um exímio enxadrista que calcula as variantes do seu oponente  antes mesmo de cada movimento seu. O que quero lhes dizer, senhores,  é que eu havia deixado gelando um  Barolo, Safra 90, para aquela ocasião. O gosto não é superiormente o mesmo de um Port Noir, mas é doce e encantadoramente suave e que estava dentro de meu orçamento. No fundo, vinho é vinho, e se tratando de Josephine, especificamente, ela não faria qualquer objeção a respeito. Sei perfeitamente de seu jogo; cada movimento frio de sua peça na captura do meu rei.  A natureza doce e ardil de Josephine, sem que ela mesma saiba, acaba me ensinando como penetrar no âmago feminino sem causar maiores transtornos. Este é o jogo sublime da sedução a que estamos absorvidos eternamente. Ah, Josephine, retorno para afirmar  aos senhores que nunca na vida vi algo de semelhante beleza, e que a própria mãe dos amores não me teria dado tantos prazeres lascívos só em contemplar...
As mulheres são uma rocha que devem ser penetradas bem devagar...
"Esta frase é sua ou do Marquês?"
"Por que? Você gostou?"
"Me pareceu atraente e original...O que tens escrito?"
"Nada de relevante...Mas vou buscar o vinho..."
"Sabe, Mário Augusto, no fundo me amarro nesse teu saudosismo anacronicamente romântico e sarcástico, ele me adoça a alma e me faz acreditar na humanidade falida dos homens..."
"Sério, meu doce? Saiba que todo homem é um amálgama..."
"Mas então, me diga, pareço uma puta vindo até aqui vestida desse jeito?"
"A mais vil e encantadora das putas do mais alto clero..."
"Você é sua língua afiada, Mário Augusto. Mas no fundo tens razão: Toda mulher é uma puta dissimulada."
"Esta conversa toda me fez lembrar os passeios matutinos da senhora de Tourville. A pintura mais honesta da mulher pintada pelo Marquês... Vou providenciar o vinho."
Deixei-a um instante sozinha na sala e fui de fato apanhar o vinho, não sem antes, é claro, colocar o Bolero de Ravel para tocar, para segundos depois, ouvi-la da cozinha com sua voz rouca e atraente, dizer-me:
"Faz isso de propósito porque sabes que sou uma apaixonada por Ravel."
"Oi?" (Eu a ouvira, é claro, só queria ter a certeza que ela ainda estava lá, apetecível como um bombom, a minha espera.)
"Adoro Ravel, eu disse."
A chuva havia engrossado um pouco, e ela por certo (a chuva) iria aumentar sua voluptuosidade e glamour, encerrando-nos definitivamente ali, por longas e prazerosas horas. Voltei imediatamente com o vinho e o depositei sobre a mesinha de vime, colocada no centro da sala.
"Ravel é uma torrente de gozo que vai crescendo dentro de nós...E tudo graças a Ida que o encomendou a Ravel para criação de um balé á moda espanhola e ele então reajuntou algumas peças antigas e recentes para piano e criou uma nova obra que na época, causou uma grande polêmica, pois que Ida apimentou a música como uma coreografia sensual..."
"E tornaram-se amantes?"
"Não tenho essa informação, mas certamente que sim. Ravel era um homem interessante e Ida, uma mulher virtuosa..."
"Sempre me encanta esse seu eruditismo. Mas isto não é um Port Noir! Não havíamos combinado um Port Noir? O que houve? Não minta!"
Como nos é impossível fugir da mentira  que é uma verdade disfarçada, então eu disse:
"É que não havia um Port Noir, então fui obrigado  a optar por um Barolo Safra 90."
"Um vinho Carcamano..."
"Contudo, um vinho. Prove e irá gostar..."
"Como se não entendesse de vinhos...Encha meu copo!"
Tratei de encher o seu copo que ela segurava com extrema suavidade e delicadeza e imediatamente senti de perto o cheiro esmaltado de suas unhas pontiagudas pintadas de vermelho misturando-se com o aroma embriagante do vinho. Três dos aromas são imprescindíveis ao olfato masculino:  o cheiro esmaltado das unhas de uma mulher, o cheiro do vinho e o doce aroma de uma buceta...